Ser uma república é coisa séria. O caso da Venezuela

Luis Beltrán Guerra G.

Por: Luis Beltrán Guerra G. - 28/09/2025


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Na antiguidade, muito mais tarde, e ainda hoje, a metodologia para nos disciplinarmos como seres com virtudes e defeitos exige analisar quais foram "os regulamentos", derivados de acordos entre nós ou determinados, impostos e acomodados por terceiros, em alguns casos como "individualidades" e em outros como "parcerias de comando". Tarefa inquietante, pois se percebeu que, em ambos os casos, sempre houve "um líder", e Deus nos livre que isso não aconteça no futuro, embora o cálculo de probabilidades, alimentado por eventos históricos, pareça pender para o oposto. Portanto, deve ser considerado com cautela, pois "o caudilho sistemático" está oculto, mas não desaparece.

O "caudillo" é geralmente concebido como "líder absoluto, ditador político e, geralmente, militar". Deriva do latim Capitellium, que, traduzido para o espanhol, significa "líder", com as variáveis ​​"político, militar ou ideológico". Esse substantivo, embora possa parecer uma invenção, nos acompanha desde muito tempo atrás, até os dias de hoje. Mas tenhamos também em mente, para entender "la dupla", o significado do adjetivo "comandita" para se referir a "a pessoa que acompanha outra", uma comitiva, uma trupe, uma congregação, uma irmandade e uma "junta". Esta última, como se sabe, é a que mais apreciamos, algo mágico com "a propriedade de curar todos os males" e que serviu, como subproduto para a fabricação, com velocidade espantosa, de regimes normativos derivados do nosso vício ad infinitum, para elaborá-los, bem como reformá-los e até substituí-los. Há, portanto, amplas evidências que sugerem que a equação "líder e colíder" não foi totalmente benéfica para nós.

Em vez disso, o caudilhismo deixou vestígios ocultos em países que parecem ter passado pelo ofício da marchetaria para se tornarem "repúblicas". Aqueles que se autodenominaram marceneiros agiram com a ajuda da "equação caudilho e comando-partido" e, em pouquíssimos casos, com intenções sérias. Os marceneiros, é difícil negar, não sabiam o que fazer com a madeira. Os sermões, numerosos, aliás, desenvolveram-se numa espécie de tipologia facilitadora do slogan "Estabeleceremos uma república real, benéfica, justa e necessária!". Esses sermões foram uma miragem, provocando reações que geralmente surgem mais tarde, buscando restaurar o que foi quebrado e salvar pelo menos alguns de nós do "cataclismo". Devemos ter em mente que as tentativas, tanto as descritas acima como as iniciativas para mudá-las, foram tão numerosas que abalaram a confiança das pessoas, a ponto de muitos perderem a esperança.

A Venezuela, como quase toda a América Latina, não escapou do esquema. Pelo contrário, foi mártir, para seu infortúnio, da "equação" e, consequentemente, da complexidade dos experimentos para torná-la realidade. Mas, para nosso infortúnio, os fatos revelam que as coisas não nos correram bem, gerando diatribes insuperáveis ​​entre nós. Na opinião de muitos, vivemos há décadas numa espécie de "ralé", que, segundo o dicionário, significa "uma multidão de pessoas ou coisas consideradas como um todo desordenado". É difícil dizer, e ainda mais quando qualquer livro que se abra destaca a posição geográfica da Venezuela na América Latina, com oportunidades de transporte marítimo, aéreo e terrestre. Além disso, ostenta excelente capital humano e vantagens competitivas de custo em relação à região. Não parece, portanto, uma afronta à Pátria perguntar: O que aconteceu e quais são as razões?

O fenômeno, como está escrito, é mais do que comum em toda a América Latina, podendo ser classificado como um "turbilhão", segundo os dicionários: "abundância, grandeza ou confusão", mas também como uma "multidão confusa de pessoas ou coisas". Mais de um capítulo da nossa história parece ser descrito dessa forma. Produto de suas próprias decepções. Os países sul-americanos de hoje, é inegável, não estão cheios de satisfação, tanto interna quanto externamente. Mas, além disso, se alguém dissesse que percebe a gravidez como plena de prosperidade, mais de um o refutaria argumentando, em uma palavra, que o ginecologista é incompetente.

Uma análise objetiva do caso venezuelano revela uma variedade de ciclos, não isentos de manifestações anárquicas, refletindo uma tendência a rejeitar os poucos momentos positivos e abraçar os desfavoráveis, uma premissa que muitos consideram ao questionar nossa independência da Espanha. Conseguimos administrar bem a liberdade que conquistamos? Continua sendo uma questão difícil, considerando como éramos e como somos.

Em um artigo de pesquisa intitulado "Novos Sentidos da Democracia que a Venezuela Busca Construir a Partir de 1999", Ingrid Karina Núñez e Nila Leal González, professoras da Universidade de Zulia, observam que a "democracia" proposta por Hugo Chávez, eleito Primeiro Magistrado em 2 de fevereiro de 1999, baseava-se na legitimidade e conveniência dos venezuelanos participarem, direta ou indiretamente, como detentores da soberania, tanto na elaboração quanto no cumprimento das disposições dos poderes públicos em prol da melhoria de sua qualidade de vida. Os valores democráticos fundamentais da Carta Magna aprovada durante aquela magistratura mencionada e que norteariam a participação cidadã eram: 1. "Igualdade, 2. Solidariedade, 3. Não discriminação e 4. Bem coletivo". Esse caminho leva os acadêmicos a descreverem o regime constitucional como uma "democracia participativa", um caminho para o envolvimento real do povo, detentor da soberania, chamado a concretizar um sistema de governo que lhe permita contribuir e adquirir conhecimento na deliberação, na tomada de decisões e no controle da gestão pública. Em última análise, na formulação, avaliação e fiscalização de políticas públicas. O trabalho enfatiza que o povo não deve se limitar à eleição de legisladores, governadores e juízes. Apesar de todas as circunstâncias descritas e dos obstáculos que o impedem, os professores reiteram que "a partir da ordem constitucional de 1999 na Venezuela, um novo sujeito será construído para viabilizar suas demandas por meio de organizações sociais, em sua opinião, uma derivação da participação cidadã". Os pesquisadores devem ser parabenizados, mas devem ser alertados de que, na construção de repúblicas, a dicotomia entre "teorismo e realismo" não deve ser ignorada.

É igualmente válido pedir aos acadêmicos que leiam o Preâmbulo da Constituição da chamada Quinta República: “O povo da Venezuela… com o objetivo supremo de refundar a República para estabelecer uma sociedade democrática, participativa e dirigente, multiétnica e pluricultural em um Estado justo, federal e descentralizado, que consolide os valores da liberdade, independência, paz, solidariedade, bem comum, integridade territorial, coexistência e Estado de Direito para esta e futuras gerações; garanta o direito à vida, ao trabalho, à cultura, à educação, à justiça social e à igualdade sem discriminação ou subordinação de qualquer tipo; promova a cooperação pacífica entre as nações; e incentive e consolide a integração latino-americana de acordo com o princípio da não intervenção e da autodeterminação dos povos, a garantia universal e indivisível dos direitos humanos, a democratização da sociedade internacional, o desarmamento nuclear, o equilíbrio ecológico e os direitos legais ambientais como patrimônio comum e inalienável da humanidade.” A única conclusão que poderíamos oferecer é que muito pouco foi alcançado pela heterogênea assembleia constituinte revolucionária. Um conselho pode ser que "repúblicas podem ser construídas sem linguagem bombástica".

No excelente livro do Dr. Tomas Polanco, "José Antonio Páez, Fundador da República", o ilustre estudioso argumenta que a Venezuela iniciou sua jornada como um Estado independente e soberano a partir de 1811, mas cuja sobrevivência foi variada e difícil devido às mudanças políticas e à Guerra da Independência. Em 1830, sob a autoridade de José Antonio Páez, a República nasceu em sua forma atual e com as características que possui. Por essa razão, conclui o professor, não há hesitação em atribuir a Páez o papel de criador da Venezuela. Para o professor Rafael Arraiz Lucca, a melhor bibliografia sobre Páez é a de Polanco.

Está escrito que, desde a fundação da Venezuela como república, ela experimentou "uma longa e complexa jornada na qual parece que tudo aconteceu. E a república parece ter se desviado, para não dizer, perdido". Foi em 1860, no primeiro processo eleitoral da história da república, que se realizou pela primeira vez uma eleição, por voto direto e secreto, para eleger o Magistrado Chefe, resultando em 48 presidentes governando o país até então. Especial consideração deve ser dada ao governo presidido por Rómulo Gallegos, pois constituiu um passo decisivo na consolidação de uma democracia derrubada pelo penúltimo "golpe de Estado" venezuelano. Isso é mais uma evidência de nossa incerteza sobre ser uma república. Com toda a justiça, não se pode ignorar, no entanto, que em 1948, quando o romancista foi derrubado, nós, venezuelanos, já tínhamos compreendido melhor o que era democracia e quais eram seus benefícios. A evidência é que, após uma década de ditadura, a vontade democrática renasceu com a presidência de Rómulo Betancourt, eleito Primeiro Magistrado em 1958.

Mas também é preciso admitir que tanto a independência quanto a autogovernança são questões complexas. Na Argentina, um país que já foi a principal economia mundial e o maior celeiro, após a ruína causada pelos mesmos "jovens" enredados no chamado "peronismo", uma personificação desastrosa do "populismo desenfreado", surgiu o partido "La Libertad Avanza", juntamente com a escolha de Javier Milei como seu primeiro magistrado. Hoje, ele está enredado entre o chamado "livre mercado" e a "motosserra" que brandiu durante sua campanha eleitoral, expressando a necessidade urgente de pelo menos "um novo motor".

O ceticismo, em linguística, "a doutrina que afirma que 1. A verdade não existe ou 2. Que, se existe, os seres humanos são incapazes de conhecê-la", nos leva a perguntar: será talvez o inimigo que nos leva ao pessimismo ou o "pana" à realidade? A resposta parece estar no livro "A Revolução dos Bichos", de George Orwell, sobre o qual o escritor Jesús Carrasco afirma que o escritor britânico nos deixou um texto que se lê como um alerta contra todo totalitarismo e como uma defesa da independência, da inteligência e, acima de tudo, da humanidade. Copiando Carrasco: "O fato de, como cidadãos, testemunharmos estratégias semelhantes na política todos os dias explicaria, por si só, a relevância do livro. Onde dizia 'sempre realizaremos eleições primárias porque somos democratas', agora diz 'elegeremos quem for mais conveniente para o líder do partido porque isso é melhor para todos'." Nesse sentido, e tendo descrito com tanta precisão o caminho que qualquer totalitarismo percorre do início ao fim, o livro funciona hoje como um alerta, assim como o fez em 1945 e possivelmente em 2025. Estes são os sinais que precedem a dominação: cuidado, Orwell parece estar nos dizendo. "E esses símbolos, basta levantar um pouco os olhos e observar, proliferam hoje em todos os cantos do globo como um sinal do que pode vir a seguir."

Concluamos tendo em mente que este ensaio aborda o significado das palavras nele mencionadas, incluindo, entre outras, "maelmagno": desordem, confusão, alvoroço, rebuliço, confusão, desorganização, desordem, desordem, mas também "caudillo" (latim: capitellium, "líder"), termo usado para se referir a um "líder" (político, militar ou ideológico). Embora em um sentido mais amplo, como lemos, também seja usado para qualquer pessoa que atue como guia para outros em qualquer campo. Por fim, acrescenta-se que o uso dado à palavra "caudillo" se deve à sua conotação política decisiva, da qual se destaca "El Collage" com alguns deles em nosso continente: Vicente Guerrero, México; Bernardo O'Higgins, Chile; Manuel Dorrego, Argentina; José Martí, Cuba; Gabriel García Moreno, Equador; e Agustín Gamarra, Peru.

Nós, venezuelanos, entre os quais felizmente estamos incluídos, somos vistos com tristeza pelo confronto em um dos momentos mais críticos da nossa história, o que não é muito questionável se sabemos quem somos. Seremos uma república? A resposta é difícil. E é ainda mais difícil ver o Mar do Caribe, que tanto amamos, cercado por navios, aviões de guerra e fuzis, todos da chamada "nova geração". Mas, além disso, o que não é pouca coisa, eles foram colocados lá pela "maior potência mundial".

Notemos que este ensaio é uma versão mais ampla do publicado na semana passada sob o título "Independência e seus derivados". É importante ressaltar que os acréscimos não deixam de reiterar nosso pesar por não termos alcançado "Uma Grande Pátria".

@LuisBGuerra


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