Incentivos perversos, corrupção e monopólios

Hugo Marcelo Balderrama

Por: Hugo Marcelo Balderrama - 28/04/2024

Colunista convidado.
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A corrupção é um dos muitos males com os quais os bolivianos convivem diariamente. Em 2022, no Índice de Percepção da Corrupção, o país ficou em 126º lugar entre 180 nações estudadas. Por sua vez, acumulou um total de 31 pontos em 100, uma classificação crítica.

Na Bolívia, nada acontece sem que um funcionário nos peça dinheiro para, ironicamente, “acelerar” os nossos procedimentos. Sejamos realistas, já normalizamos propinas, “presentes” e subornos.

Embora, principalmente em tempos eleitorais, todos comecem a falar em corrupção, ninguém identificou a origem do mal, portanto, não acertam no diagnóstico.

John Mukun Mbaku, economista, professor universitário e conselheiro político, no seu livro: A corrupção em África, explica a corrupção como uma questão de incentivos perversos. Ou seja, ocorre em grande escala quando há um grupo que capturou o poder político para obter benefícios pessoais, mas não de forma honesta, mas sim ferrando o cidadão comum.

Estes grupos não estão exclusivamente dentro do aparelho burocrático. Na verdade, podem ser sindicatos, associações profissionais ou câmaras empresariais que do sector privado utilizam o seu poder e ligações para obter privilégios, mercados cativos ou subsídios.

Mukun Mbaku afirma que os monopólios são a forma mais extrema de corrupção, pois violam todo o sistema jurídico e económico em benefício de um grupo de empresas. Logo, o monopólio não é uma grande empresa, mas um grupo com capacidade para atacar o sistema de livre concorrência.

Em 1912, Ludwig von Mises, em: Teoria do Dinheiro e do Crédito, tomou como exemplo as empresas que produzem material de guerra para explicar como certos grupos corporativos lucram com a inflação:

Se, por exemplo, um papel-moeda for emitido em tempo de guerra, as novas notas irão primeiro para os bolsos dos fornecedores de material de guerra. Com isso, a demanda dessas pessoas por determinados itens aumentará, assim como sua venda e preço, principalmente por se tratarem de itens de luxo. Desta forma a situação dos produtores destes artigos melhorará; a sua procura por outras mercadorias também aumentará, continuando assim o aumento dos preços e das vendas, distribuindo-se por um número continuamente crescente de artigos, até que finalmente alcance todos eles. Neste caso, há uns que ganham e outros que perdem com a inflação. Basicamente, os vencedores são aqueles que recebem o dinheiro novo a um nível de preço mais baixo.

Se tomarmos o caso exemplificado por Mises, podemos deduzir que os armeiros estarão sempre interessados ​​em aumentar os gastos militares, mesmo em tempos de paz.

Contudo, independentemente do sector, surgem sempre caçadores de privilégios que procuram apoderar-se das despesas do Estado. Por exemplo, em 2021, a ONG FORES (Fórum de Estudos sobre a Administração da Justiça) apresentou um relatório da sexta rodada do Mecanismo de Acompanhamento da Implementação da Convenção Interamericana contra a Corrupção (MESICIC) da OEA no qual concluiu que a Argentina é um paraíso para a corrupção.

Qual foi um dos mecanismos mais utilizados para se beneficiar da corrupção?

Eureka, gastos do Estado em obras públicas, especialmente em estradas.

Com efeito, o processo aberto por corrupção na adjudicação de obras públicas contra Lázaro Báez foi a ponta da linha para condenar Cristina Fernández a seis anos de prisão.

Neste momento, com o estranho suicídio de Juan Carlos Montenegro no meio, um mega escândalo de corrupção ligado ao lítio eclodiu na Bolívia. A esse respeito, El Deber, jornal do departamento boliviano de Santa Cruz, em seu editorial intitulado: Litio, a velha história da corrupção (23/04/2024), afirma que:

A estagnação do projecto de lítio não é simplesmente um fracasso económico, é um sintoma de um mal mais profundo que aflige a Bolívia: a política persistente, a ineficiência burocrática e a corrupção profundamente enraizada. À medida que os políticos se envolvem em disputas partidárias e os funcionários públicos enriquecem à custa do povo, o país fica para trás num mundo que avança rapidamente em direcção à sustentabilidade e à inovação.

Concordo plenamente com o editorial. Contudo, para acabar com a politicagem e a corrupção, é necessário desmantelar o Estado Plurinacional, liberalizar a economia e devolver ao sector privado o papel na criação de riqueza.

Será que tais ideias podem prosperar num país onde a dependência do Estado está tão arraigada?

Não sei. Mas fico feliz que, impulsionados pela crise moral e económica que vivemos, estas questões já estejam a ser debatidas em alguns espaços públicos, especialmente entre os mais jovens.


As opiniões aqui publicadas são de inteira responsabilidade de seus autores.