Estados Unidos: da Iniciativa das Américas à APEP

Beatrice E. Rangel

Por: Beatrice E. Rangel - 14/11/2023


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Já se passaram 34 anos desde que o presidente George Bush anunciou o Projeto Iniciativa para as Américas, cujos pilares eram: o Plano Brady para reestruturar a dívida dos países latino-americanos; estabelecimento da maior área de livre comércio do mundo no hemisfério, o ALC, e um fórum de promoção da democracia, a Cúpula Interamericana.

Estimava-se nessa altura que, ao libertar as economias da região do fardo da dívida e ao criar um espaço de comércio livre que encorajasse uma explosão nos investimentos, a região continuaria o seu desenvolvimento democrático num quadro de crescimento económico e de futuro esperançoso.

Estes cenários auspiciosos nunca se materializaram graças ao ataque concertado das chamadas forças de esquerda e de direita na região. Para a esquerda que começava a sair dos claustros universitários e dos sindicatos para ascender ao topo do poder em diversas nações da região, o livre comércio e a prosperidade alcançada em parceria com os Estados Unidos eram fundamentais. Com efeito, o credo marxista mal aprendido definia o comércio livre como uma cadeia de exploração e os Estados Unidos como a nação que dirige a exploração. Se a realidade demonstrasse o contrário, o povo da região perceberia que durante séculos os senhores da esquerda os enganaram. E isso, claro, era inaceitável, uma vez que equivalia à autodestruição.

Os senhores da também equivocadamente chamada direita, formada fundamentalmente pela classe empresarial, por sua vez, também não se convenceram da ideia de ter que competir com empresas americanas ou com uma nação mais eficiente da América Latina. Para os seus membros, o comércio restrito era o melhor de todos os mundos porque poderia fazer com que o público que acaba por pagar um prémio por produtos de qualidade inferior pagasse o custo das suas ineficiências.

E houve uma espécie de pacto diabólico entre a esquerda e a direita que arruinou a proposta dos Estados Unidos, que, aliás, tinha sido desenhada por vários ganhadores do Prêmio Nobel de Economia que visavam acelerar a criação de classes médias ao sul do Rio Grande. .

Hoje a situação é mil vezes pior do que aquela que marcou a década de noventa do século passado. A maioria das economias parece exausta e sem força vital para continuar a crescer; A COVID 19 demonstrou a fragilidade do quadro institucional que gere os serviços de saúde e educação na região e revelou o comportamento rentista das elites da região quando, em vez de cooperarem na resolução da crise, fizeram o máximo de negócios que puderam com todos os suprimentos médicos e farmacêuticos necessários para combater o mal. Como consequência, as sociedades civis de vários países eclodiram em protestos que foram explorados e penetrados por elementos radicais e pelo crime organizado para paralisar a Colômbia; transformar Santiago do Chile numa imensa pira e incendiar o Equador.

Neste contexto, a administração Biden lança a proposta APEP (Parceria das Américas para a Prosperidade Económica). Esta iniciativa lembra muito aquela que falhou miseravelmente em termos de criação de prosperidade na América Latina. Essa foi a Aliança para o Progresso na qual os Estados Unidos investiram 18 mil milhões de dólares para ver o colapso das economias da região na década seguinte. Desta vez não haverá infusão de investimentos nem comércio livre. O que nos faz presumir que a região continuará a ver o seu desenvolvimento sequestrado pela esquerda e pela direita.


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