Coca Nostra está queimando Pachamama

Hugo Marcelo Balderrama

Por: Hugo Marcelo Balderrama - 19/11/2023

Colunista convidado.
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La Cosa Nostra é uma expressão usada para indicar uma organização criminosa, mafiosa e terrorista presente na Sicília e em muitas partes do mundo. Tomando as três últimas características poderíamos fazer uma analogia com a atual realidade boliviana. No nosso caso aplicar-se-ia a expressão: coca nostra, já que a coca, como matéria-prima da cocaína, tornou-se uma maldição para as reservas naturais, florestas e selvas de vegetação média, mas, sobretudo, para o meu país, que acabou por se transformar num ditadura das drogas.

O paradoxo da questão é que a destruição da natureza boliviana não está sendo levada a cabo sob um governo “neoliberal” e “de direita”, mas sob um governo que defende a defesa da natureza, do meio ambiente e da biodiversidade, o que comumente chamam : Pachamama.

Porém, a destruição da biodiversidade boliviana não começou agora, nem com a tragédia do incêndio da Chiquitânia em 2019, mas sim é uma constante do regime, já que a expansão da fronteira da coca e a produção massiva de cocaína são os pilares do Movimento ao Socialismo. A este respeito, Emilio Martínez, escritor e analista político, num artigo intitulado: A economia do fogo, afirma o seguinte:

A Bolívia era líder mundial na gestão de florestas com selo verde no início do século XXI, ultrapassando os 2,2 milhões de hectares certificados, mas atualmente caiu para cerca de 800.000 hectares, devido a invasões e à falta de um regime fiscal especial, o que ajuda na formalização do setor.

Reparem numa coisa, toda aquela produção teatral com temas e feitiçarias pré-colombianas com que Evo Morales tomou posse como presidente em 22/01/2006 eram, na verdade, fachadas para encobrir a natureza criminosa do líder coca, já que o crime e o tráfico de drogas são o único que teve sucesso em duas décadas de ditadura. Sobre o assunto, Beatriz Quintero, investigadora do grupo Insight Crime, afirma que:

A Bolívia, um dos países mais pobres da América Latina, é o terceiro maior produtor mundial de coca, depois da Colômbia e do Peru, e um importante ponto de trânsito de drogas. Além de servirem de ponte aérea para a cocaína peruana, organizações criminosas estrangeiras estão sediadas na Bolívia, principalmente grupos brasileiros. A presidência de Morales foi caracterizada por relações tensas com os Estados Unidos sobre as plantações de coca e as operações antidrogas. Em 2008, Morales expulsou o embaixador dos EUA por “conspirar” contra o seu governo e suspendeu a cooperação com a Administração Antidrogas dos EUA (DEA), que mais tarde também expulsou do país. Posteriormente, o Gabinete de Política Nacional de Controlo de Drogas da Casa Branca (ONDCP) incluiu a Bolívia na sua lista negra.

Nos últimos anos, a paz e a tranquilidade são algo que os cidadãos bolivianos perderam abruptamente, uma vez que a posição da Bolívia como centro regional de drogas há muito faz do país uma base de operações para organizações estrangeiras de tráfico de drogas, com toda a degradação que isso acarreta, por exemplo, assassinos.

Embora os narcotraficantes bolivianos já tivessem conseguido escapar do controle dos cartéis colombianos na década de 1980, isso não significa que a presença de organizações criminosas desse país na Bolívia seja zero. Por exemplo, durante o golpe de Estado de Outubro de 2003, as FARC e o ELN tinham quase 600 dos seus milicianos a operar em La Paz e Cochabamba.

Hoje em dia, especialmente nas cidades de Santa Cruz e Cochabamba, é muito comum o acerto de contas realizado por assassinos colombianos. Mas o submundo não se limita a esses grupos. No final de setembro deste ano, a Polícia Boliviana conseguiu resgatar 20 pessoas vítimas de tráfico de pessoas. As investigações revelaram que este caso está ligado ao polêmico Trem Aragua, uma organização criminosa venezuelana que opera na Bolívia.

Tudo isso acontece sob o olhar e a paciência de um ditador em exercício que, literalmente, deixou tudo ao acaso. Só havia discursos e dados de veracidade duvidosa cada vez que ele tinha câmeras e luzes na frente. Enquanto isso, a Bolívia queima por causa da ambição dos cocaleiros e dos mineiros que pretendem contaminar todas as águas do país com mercúrio.


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