Chaves para entender o desembarque do Grupo Wagner na Venezuela

Beatrice E. Rangel

Por: Beatrice E. Rangel - 06/08/2024


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O Grupo Wagner fundado por Yevgeny Prigozhin e Dmitry Utkin em 2014 instalou-se na Venezuela, anunciando assim que a Rússia fornecerá informação, apoio logístico e militar ao governo ilegítimo de Nicolás Maduro. As suas tropas participaram nas missões repressivas desencadeadas contra manifestantes pacíficos pelo regime venezuelano desde a sua tentativa falhada de fraude eleitoral ocorrida em 28 de julho.

O objectivo fundamental do grupo criado como órgão militar “privado” é facilitar a intervenção militar da Rússia em países e regiões do seu interesse geopolítico sem ter de empenhar os seus recursos materiais e enfrentar o repúdio mundial ou acusações de violação do direito internacional.

Este exército mercenário serviu a Rússia para intervir na Síria sem deixar vestígios da sua presença e, portanto, não enfrentar as sanções mundiais quando Wagner utilizou armas químicas proibidas pelas Nações Unidas contra a população civil.

Desde a sua criação, o Grupo Wagner carregou a marca de Vladimir Putin. O seu talento geopolítico combinado com o conhecimento do comércio de espionagem e das táticas repressivas levaram-no à conclusão de que um bando mercenário que contasse com o apoio das redes de inteligência e espionagem das forças armadas russas poderia constituir o complemento perfeito para os seus planos de expansão geopolítica. Para ele, era necessário recompor o mapa de penetração do Sul Global que prevaleceu durante a existência da União Soviética. Esse mapa deu prioridade a duas regiões: África e Médio Oriente.

África representa um canal para influenciar a política europeia, uma vez que as matérias-primas com que trabalham as empresas daquela região são extraídas do continente negro. O Médio Oriente constitui o melhor canal de intercâmbio com o terrorismo internacional e através dele abrem-se múltiplas possibilidades para pressionar a Europa e os Petro-estados.

A participação do Grupo Wagner na invasão da Ucrânia facilitou o ataque russo. Porque graças às violações massivas dos códigos de guerra internacionais e dos direitos humanos em que sofreu, conseguiu aterrorizar a população. Também permitiu ao governo russo manter a repressão interna sem ter de desviar recursos do destacamento militar. E assim a Rússia conseguiu controlar os seus habitantes enquanto levava a cabo uma destruição macabra da infra-estrutura vital do seu vizinho.

Segundo os fundadores do Grupo Wagner, o seu exército teria destruído a Ucrânia há muitos meses se não fosse pela falta de jeito do exército russo. Este descontentamento levou-os a revoltar-se contra o Kremlin e a embarcar na tomada de Moscovo. Sem qualquer explicação, a revolta foi paralisada por Prigozhin e Utkin antes de chegar a Moscovo. Ambos partiram para Bielo, na Rússia. Mais tarde, reuniram-se com responsáveis ​​de Putin e do Kremlin antes de embarcarem no avião que os levaria para a morte.

Especialistas em assuntos militares indicam que a missão do Grupo Wagner é manter o fluxo de matérias-primas da África para a Rússia. Para este fim, serve de pilar militar para os déspotas mais cruéis que governam no Chade, na República Centro-Africana, na Líbia, no Mali e no Sudão. E a forma de pagamento é a participação na exploração dos recursos naturais.

Quando Prigozhin e Utkin morreram, o governo russo empreendeu a reestruturação do corpo, chamando-o de Corpo Africano. Fontes bem informadas asseguram que o controlo do extinto Grupo Wagner passou então para o general russo Andrey Averyanov, chefe de uma unidade do serviço secreto especializada em planear assassinatos de inimigos da Rússia, como foi o caso da tentativa de envenenamento de Sergei Skripal em Salisbury, Reino Unido. .

O desembarque na Venezuela se deve a dois objetivos russos. A primeira é evitar que uma mudança de regime os prive das suculentas compras de armas de que depende o exército bolivariano. A segunda é manter vivo o regime de Havana, garantindo o seu abastecimento de petróleo. Cuba é um peão importante no xadrez, uma vez que fornece serviços de espionagem e mobilização de activos pró-Rússia nos Estados Unidos. Alguns especialistas afirmam que estes serviços de observação e formação de activos tiveram muito a ver com a preparação do ataque ao World Trade Center em Nova Iorque em 2001.

Na Venezuela, o Corpo Africano poderá liderar a exploração de ouro, coltan e outros minerais essenciais para a indústria electrónica. Portanto, terá que enfrentar o ELN, as FARC dissidentes e outros grupos mafiosos. O que não parece constituir um grande problema para este exército privado de apoio à Rússia.


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