América Latina, onde as distopias se tornam realidade

Hugo Marcelo Balderrama

Por: Hugo Marcelo Balderrama - 28/09/2025

Colunista convidado.
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Quando falamos de distopia, ou também antiutopias ou cacotopias, referimo-nos a uma visão ficcional da sociedade humana na qual, em termos simples, as coisas vão muito mal para as pessoas comuns, mas muito bem para os poderosos. O gênero se desenvolveu, embora não exclusivamente, na literatura, na filosofia e no cinema. Vejamos alguns exemplos:

Em 1984, o escritor britânico George Orwell descreveu uma Inglaterra futurista, chamada Engsoc, governada por um regime de vigilância permanente sob o olhar autoritário do Big Brother. A tecnologia da comunicação cumpre simultaneamente duas funções: vigilância e doutrinação, e os processos de engenharia social têm um único objetivo: fazer com que as pessoas amem seus algozes.

Em Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley descreve um futuro em que a tecnologia passou a controlar todos os aspectos da vida humana. Nessa sociedade, a reprodução ocorre em úteros sintéticos, e a humanidade é fortemente estratificada em grupos imutáveis ​​(alfas, betas, gamas), que são mantidos sob controle por meio de hipnopedia e uma droga chamada soma, que induz um estado de felicidade e tranquilidade. O protagonista, um "selvagem" nascido no mundo exterior, entrará nessa sociedade, alguém que compartilha o maior desejo da humanidade: a liberdade.

Fahrenheit 451 é um romance distópico do escritor americano Ray Bradbury. O romance apresenta uma sociedade americana futurista onde bombeiros queimam livros. Qualquer um que o leia é um perigo, porque o conhecimento gera questionamentos; questionamentos levam à rebelião, e rebelião é algo que regimes totalitários não permitem.

Costumo conversar com meus alunos sobre os romances mencionados acima. O resultado é sempre o mesmo: eles percebem as histórias não como ficção científica ou fantasia, mas como algo perfeitamente tangível na vida cotidiana.

A razão é muito simples: vivemos no século XXI em meio a tentativas cruéis de colocar distopias em prática, vejamos:

A censura literária foi estabelecida como política de Estado em Cuba após a vitória de Fidel Castro. Criticar o socialismo, satirizar um de seus membros e questionar as políticas de Castro eram motivos suficientes para que a ditadura colocasse obras na lista de ameaças e seus autores como vermes pró-ianques. Assim, um grande número de livros e autores, nacionais e estrangeiros, foram proibidos pelas editoras cubanas por diversos motivos. Muitos desses episódios ocorreram apenas como uma réplica da censura na União Soviética, já que os títulos pouco ou nada tinham a ver com a realidade cubana ou latino-americana, como, por exemplo, Doutor Jivago, de Boris Pasternak.

Na Bolívia, Evo Morales e seus capangas tentaram replicar o modelo cubano, já que a Lei Avelino Siñani, sob o pretexto da descolonização, buscava impor às crianças uma visão tendenciosa da história. Uma visão na qual Morales não é um traficante de cocaína, mas um ativista social que luta pelos povos indígenas bolivianos, e até mesmo pelo mundo.

Na época dos plantadores de coca, a Bolívia tinha sua própria versão do Soma de Huxley: eram os gastos públicos que compravam consciências, silenciavam vozes e deixavam muitos "felizes". Os "selvagens" e "infiéis" éramos todos nós que ousávamos questionar as narrativas oficiais sobre o "milagre" econômico boliviano.

Da mesma forma, de forma orwelliana, os produtores de coca usaram o terrorismo de Estado para silenciar vozes dissidentes, como no caso do Hotel Las Américas em 2009.

Sem mencionar a Venezuela e a Nicarágua, onde ditaduras fundiram bruxaria com ideologia para transformar seus tiranos em seres oniscientes e onipotentes. Uma espécie de religião ditatorial que busca absorver todos os aspectos da vida de seus súditos.

Mas enquanto ditadores vivem em suas torres de marfim, pessoas comuns têm que enfrentar as consequências do tráfico de drogas desenfreado, da inflação crescente, do aumento da pobreza e da brutalidade das ditaduras. Em suma, a América Latina é onde as distopias se tornam realidade.


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